segunda-feira, 27 de abril de 2009

SERAPIÃO

Serapião era um velho mendigo que perambulava pelas ruas da cidade. Ao seu lado, o fiel escudeiro, um vira-lata que ele chamava de Malhado.
Serapião não pedia dinheiro, aceitava sempre um pão, uma banana, um pedaço de bolo ou um almoço feito com sobras de comida dos mais abastados.
Quando suas roupas estavam imprestáveis, era sempre socorrido por alguma alma caridosa, mudava a apresentação e era alvo de brincadeiras.
Serapião era conhecido como um homem bom, que perdera a razão, a família, os amigos e até a identidade.Não bebia bebidas alcoólicas, estava sempre tranqüilo, mesmo se não tivesse um pouco de comida. Dizia sempre que Deus lhe daria um pouco na hora certa e, sempre na hora que Deus determinava alguém lhe estendia uma porção de alimentos. Ele agradecia com reverência e rogava a Deus pela pessoa que o ajudava. Tudo o que recebia, dava primeiro ao Malhado que, paciente comia e ficava a esperar de mais um pouco.
Não tinham onde dormir, onde anoiteciam, lá dormiam.
Quando chovia, procuravam abrigo debaixo da ponte e, ali o mendigo ficava a meditar, com um olhar perdido no horizonte.
Aquela figura deixava-me sempre pensativo, pois eu não entendia aquela vida vegetativa, sem progresso, sem esperança e sem um futuro promissor.
Certo dia, com a desculpa de lhe oferecer umas bananas, foi conversar com o velho Serapião. Iniciei a conversa falando do Malhado, perguntei pela idade dele, mas o Serapião não sabia. Dizia não ter idéia, pois se encontraram um certo dia quando ambos andavam pelas ruas e disse:
- A nossa amizade começou com um pedaço de pão, ele parecia estar faminto e eu ofereci-lhe um pouco do meu almoço e ele agradeceu abanando o rabo, e a partir daí, não me largou mais, ele ajuda-me muito e eu retribuo essa ajuda sempre que posso.
Curioso perguntou-lhe:
- Como é que vocês se ajudam?
- Ele vigia-me quando estou a dormir. Ninguém pode chegar perto que ele ladra e ataca. Também quando ele dorme, eu fico de vigia, para que nenhum cachorro o incomode. Continuando a conversa, perguntei:
- Serapião, você tem algum desejo na vida?
- Sim, respondeu ele, tenho vontade de comer um cachorro quente, daqueles que a Zezé vende ali na esquina.
- Só isso? Indaguei.
- É no momento é só isso que eu desejo.
- Pois bem, vou satisfazer agora esse grande desejo.
Saí e comprei um cachorro quente para o mendigo, e ofereci-o.
Ele arregalou os olhos, deu um sorriso, agradeceu a dádiva e em seguida tirou a salsicha e deu-a ao Malhado, e comeu o pão com os temperos. Não entendi aquele gesto do mendigo, pois imaginava ser a salsicha o melhor pedaço, não me contive e perguntei intrigado:
- Porque deu ao Malhado a melhor parte do cachorro quente, que é a salsicha?
Ele com a boca cheia respondeu:
- Para o melhor amigo, o melhor pedaço!
E continuou a comer, alegre e satisfeito. Despedi-me do Serapião, passei a mão na cabeça do Malhado e sai pensando...
Aprendi como é bom ter amigos! Pessoas em que possamos confiar.
Por outro lado, é bom ser amigo de alguém e ter a satisfação de ser reconhecido como tal.
Jamais esquecerei a sabedoria daquele eremita:" PARA O MELHOR AMIGO O MELHOR PEDAÇO "

(Autor do texto: desconhecido)